Fonte: Exame
No SDGs in Brazil, evento organizado pelo Pacto Global da ONU no Brasil, na sede da ONU em Nova York, há um consenso: não é possível mitigar os desafios das mudanças climáticas sem incluir grupos socialmente minorizados nas conversas e mesas de decisão. Pensando nisto, foram promovidas salas temáticas de direitos humanos ao longo do evento na última sexta-feira, 15.
Durante um dos painéis, pela manhã, uma mesa formada por executivas negras levantou questões como a necessidade de estruturação, orçamento e acompanhamento de resultados para a diversidade e inclusão nas companhias. “Este momento se conecta com os movimentos que têm metas claras, como o Elas Lideram, no qual as empresas associadas se comprometem a ter 50% de mulheres em cargos de alta liderança até 2050; e o Raça é Prioridade, com objetivo de ter 50% de pessoas negras em posição de liderança até 2030”, diz Tayná Leite, gerente sênior de direitos humanos no Pacto Global da ONU no Brasil.
Um importante apontamento para o avanço das agendas é o de que as mulheres e as pessoas negras não são de fato minorias no Brasil, mas sim socialmente minorizadas. “Mulheres são 51% da população e pessoas negras são 56%. O que estamos buscando, a partir disto, é a geração de oportunidades iguais para que a diversidade possa ser uma potência de negócios e desenvolvimento no país”, diz Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora.
A disparidade é tão grande que, em 200 anos de história, pela primeira vez o Banco do Brasil tem uma mulher na presidência. “Somos um conglomerado de empresas com 125.000 funcionários em onze países. Temos a missão de mudar os critérios de promoção e acelerar a equidade”, afirma Tarciana Medeiros, presidente do Banco de Brasil.
De acordo com a executiva, o percentual de mulheres aprovadas para cargos acima da gerência média em 2022 foi de apenas 25% de mulheres. Percebendo isto, houve uma estratégia de reforço da presença delas no processo seletivo. Assim, a proporção de aprovadas subiu para 65%. “Na diretoria, por exemplo, de 10 vagas 6 mulheres foram nomeadas. Além disto, é importante dizer que o comitê de diversidade tem o mesmo peso do comitê de crédito, por exemplo”.
Na fabricante de bens de consumo Nestlé, há metas e o acompanhamento frequente do resultado. “É importante que tenha ação intencional, mas também que tenha o olhar atento para que o ponteiro de fato mude”, diz Helen Andrade, head de diversidade da Nestlé. A executiva garante que a companhia tem tido boas estratégias. “Fui chamada para atuar num cargo semelhante em outra companhia que me queria apenas como porta-voz para fora e não como alguém que executa para que a equidade de fato aconteça, e não é nisto que acredito”.
Diversidade nas PMEs
Diversidade e inclusão não são pautas necessárias e possíveis apenas nas grandes empresas. Foi ao perceber isto, que a jornalista Juliana Oliveira fundou a agência de comunicação Oliver Press. “Me tornei jornalista ao ver Glória Maria, uma mulher negra como eu, exercendo a profissão. Mas também me tornei empreendedora ao perceber que precisava ocupar esse espaço de mudança”, afirma. Hoje, a Oliver Press tem 45 funcionárias, sendo 59% negras.
Já na empresa de recurtamento e seleção 99jobs, a chefe de diversidade e inclusão Priscila Salgado tem a missão de olhar para o tema internamente, mas também no processo de candidatura dos clientes. “Temos 180.000 jovens negros aplicando anualmente em processos seletivos, mas nem 10% passam. Se o poder econômico não vai pra mão deles a gente não muda o sistema do país e não avança no setor privado e público”.
A equidade de racial e de gênero foi tema de todo o evento ao longo da última quinta e sexta-feira. Um dos exemplos disto é a grande presença de pessoas negras brasileiras nas mesas de discussão e espaços de networking. “A perspectiva da negritude brasileira em ambiente corporativo é uma missão inovadora e extremamente potente. O Brasil produz, contraditoriamente ao que é investido, grandes lideranças negras, que desenvolvem economia criativa e sustentável possível de exportação para todo o mundo. Intencionalidade, investimentos, metas construídas com seriedade e a ousadia antirracista pode colocar todo o país no topo”, diz Raquel Vírgina, CEO da consultoria Nhaí.
Camila Valverde, diretora de impacto do Pacto Global da ONU no Brasil, concorda com a necessidade de intenção para o desenvolvimento. “Precisamos alinhar as nossas ações com o que defendemos. E, ter uma delegação diversa no nosso evento em Nova York é parte disto, pois ter intencionalidade é fundamental. Só teremos um país desenvolvido quando a ocupação de todos os espaços refletir o retrato da população brasileira”, finaliza.