Divulgação de informações sobre ações e critérios ESG das empresas na bolsa é inconsistente e pouco transparente, avalia estudo

Fonte: Um Só Planeta – Globo

As grandes empresas brasileiras listadas na B3, a Bolsa de Valores de São Paulo, apresentam pouca transparência em relação às suas práticas de ESG, mesmo atuando em setores de elevados riscos ambientais e climáticos. Essa é a principal conclusão do estudo recém-divulgado pela Associação Soluções Inclusivas Sustentáveis (SIS) sobre o fortalecimento da agenda ESG em temas cruciais nas normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que regula o mercado de capitais brasileiros.

O estudo consultou normas brasileiras existentes para estruturar essa agenda, que se refere às práticas envolvendo gestão ambiental, social e de governança nas empresas. Também foram avaliadas normas da União Europeia e novas iniciativas de autorregulação global, para gerar então uma série de recomendações sobre como nosso mercado pode melhorar nesse aspecto considerado crucial para a adequação das empresas às necessidades atuais do planeta e da sociedade.As recomendações à CVM visam tornar mais transparente a divulgação dos critérios e práticas de ESG nas empresas que emitem títulos e valores mobiliários, tornar mais consistente a rotulagem de produtos de investimento ligados a essas práticas e até a estimular a criação de ratings, ou um índice de avaliações, das empresas em relação a esse aspecto (algo que já é discutido na Europa, diz a SIS).

Isso porque, afirma a associação, foram encontrados vários problemas em como esses temas são tratados atualmente nas grandes empresas presentes na B3. Por exemplo: desconhecimento ou falta de monitoramento da cadeia de valor de algumas empresas; empresas que emitem títulos verdes, mas que não possuem evidência mínima de que cumpram a legislação referente às práticas socioambientais; e disparidade salarial que pode chegar a 1700 vezes entre o rendimento médio dos funcionários e o do CEO.

A SIS aponta que é necessária uma regulação mais estrita da agenda ESG para que investidores interessados em seguir esses critérios possam fazê-lo com maior grau de confiança. “É importante evidenciar que certos temas nunca serão divulgados – ou não o serão de forma útil para investidores – se a regulação não tiver a abrangência e a clareza necessárias”, afirma Luciane Moessa, diretora executiva e técnica da SIS e uma das autoras do estudo.

“Construir uma economia sustentável, sob os prismas ambiental, social e econômico (e as questões climáticas afetam esses três eixos), deveria ser um dos objetivos almejados pelas ‘regras do jogo’ do mercado de capitais”, segue a diretora, lembrando que o mercado de capitais tem grande importância na economia, por ser normalmente a principal fonte de acesso a capital para grandes corporações – e estas têm o poder de influenciar uma grande cadeia de valor se seguirem critérios sustentáveis.

Pontos críticos do estudo

Foram avaliadas no estudo 60 empresas listadas na B3, e, destas, 52 têm relatórios de sustentabilidade. Porém, das oito que não possuem, sete atuam em setores de alto risco ambiental. A partir daí, uma primeira recomendação é que a CVM passe a definir quais empresas devem elaborar relatórios de sustentabilidade – hoje, a regulação as deixa livres para decidirem sobre relatar ou não.

“Confiar tão somente nas iniciativas de mercado para que isso [a divulgação das informações relativas à sustentabilidade] ocorra tem historicamente se mostrado ingênuo e nada efetivo. Tais iniciativas são muitas vezes permeadas por conflitos de interesse e repletas de “free riders” que buscam se incluir na visão dos líderes apenas no discurso, mas não nas ações”, diz o estudo.

Mesmo entre as empresas que divulgam relatórios de sustentabilidade, nenhuma delas descreve situações concretas envolvendo cumprimento de normas sociais relativas à sustentabilidade, aponta a SIS. Tampouco apresentam um panorama de todas as suas unidades com relação ao cumprimento de questões ambientais.

Ainda, 90% das empresas não trazem sequer exemplos de riscos sociais que suas atividades podem causar, e 86% não abordam riscos ambientais específicos.

Outro ponto de atenção e de risco, segundo a SIS, são os Fundos de Investimento em atividades com altos riscos socioambientais e climáticos. Estes, aponta a organização, precisam de uma avaliação cautelosa da CVM para evitar que o mercado de capitais se transforme em alternativa para financiar atividades que causem danos ao meio ambiente, ao clima e à sociedade.

O estudo pontuou ainda a necessidade de as empresas divulgarem os riscos e impactos em sua cadeia de valor e divulgarem a localização de suas operações. Também enfatizou a necessidade de o relatório considerar indicadores-chave para o setor econômico, a serem definidos na regulação.

Posição da CVM

Comentando o estudo, Nathalie Vidual, superintendente de proteção e orientação aos investidores da CVM, diz que “o levantamento de dados promovido pela SIS foi importante para compreender o cenário atual”.

“Essa amostra trouxe diversidade de setores, o que vai permitir olhar para quem merece mais atenção e o que pode ser feito. Além disso, a CVM tem conversado com agências de rating ASG e em breve vai lançar um plano de ação da política de finanças sustentáveis para ser divulgado”, promete a executiva.

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