Negros são ações em baixa no universo das empresas da Bolsa de Valores

Texto: José Vicente para Veja.

Num momento em que a diversidade e inclusão têm sido reconhecidas como políticas e ferramentas estratégicas de mais produtividade, criação, lucro, rentabilidade, maior prestígio e reconhecimento reputacional nos grandes centros políticos e econômicos do mundo, e a filosofia do ESG vem ganhando ares de consenso e de valor nos ambientes públicos e privados do nosso país, o estudo da MZ Consult que compilou as informações das ações de governança, questões ambientais, sociais e raciais divulgado nos formulários de referências da Comissão de Valores Mobiliários pelas empresas em maio de 2022, jogou uma ducha de água fria naqueles sempre otimistas da capacidade de indução e mudança autônoma e voluntário do mercado.

O formulário estruturado pela CVM através da resolução 59 é o principal documento a ser preenchido pelas empresas de companhia aberta. Agora, além das informações ambientais e sociais, passa a incluir as raciais. Com isso, passam a ser uma fonte de qualidade das informações e de evidências do grau de diversidade e de verdade nas empresas ali representadas. Vale lembrar que a resolução 59 é um retrato para dizer o quanto as companhias estão profundamente alinhadas com o direcionamento dos mais diversos ambientes de regulação, supervisão e fiscalização, assim como, as orientações de investidores públicos e privados do Brasil e do exterior.

Todavia, das 358 empresas listadas na bolsa na B3, ela mesma entusiasta, estimuladora e realizadora de importantes ações e de implementação de medidas de valorização do ESG, os pretos e pardos não chegam a 4% dos administradores. Nos conselhos de administração, a situação é ainda pior, menos de 3%. Entre os cargos de liderança, os negros somam 23%. Tanto quanto esse apagão de negros nos quadros de liderança nessas empresas é de surpreender o fato de que 71% delas afirmaram no formulário de referência que adotam práticas ESG, o que junto com a percepção de sempre agora comprovada mais uma vez com os resultados do estudo, denotam que o que as empresas falam não é o que elas fazem. Em outras palavras a branquitude continua imperando e os negros permanecerão tendo que esperar.

É lógico que não preciso o relatório da CVM para saber do óbvio e do que os sentidos sempre souberam. Mas, a cada relatório, medida ou ação que torna visível, conhecida e oficializada a clareza da informação, resta fortalecida efetividade da exclusão e o falseamento e contradição do discurso e da ação. O Relatório da CVM joga luz na escuridão do mercado de ações, das empresas listadas e do real estado da arte do ambiente corporativo. Pode e deve prestigiar o esforço da honesta transformação e da mudança. Da mesma forma, no entanto, deve publicizar, desestimular e punir o engodo, a ambiguidade e a embromação.

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